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Condicionamento evolutivo III  (Continuação)

Parte III

Julio Cesar do Nascimento

Da obra Racionalismo Cristão, no capítulo "O livre-arbítrio":

O livre-arbítrio é uma faculdade que surge quando a partícula inteligente ingressa na fase que lhe dá o cunho característico dos seres racionais. Nesta fase o espírito tem a consciência do bem e do mal. Mesmo que desconheça a Verdade sobre as leis da evolução, há no seu íntimo, um estado consciente, sensível à apreciação do bem e do mal...

Na concepção racionalista cristã, "Livre-arbítrio quer dizer liberdade plena de ação seja para o mal, seja para o bem, entendendo-se por mal ou por bem o ato que contraria ou favorece o curso normal da evolução."

Destaca-se esta concepção racional de mal ou bem, pois nada tem a ver com as concepções religiosas ou sectárias. Estas, desde a Antigüidade, tratam a dualidade bem e mal como manifestações da divindade superior e da sua antítese inferior, manifestações de reinos separados e concorrentes.

Para o Racionalismo Cristão, o termo livre-arbítrio nascido na filosofia tomou a sua feição espiritualista transcendendo a experiência da volição da mente como entidade isolada do corpo, sua feição filosófica original, para tornar-se atributo do espírito em sua manifestação enquanto encarnado como pessoa humana. Vamos contudo concentrar-nos no cerne da questão, qual seja a liberdade plena de ação, como o desenvolvimento progressivo e uso consciente do livre-arbítrio.

Tratou Descartes do tema liberdade e suas reflexões são ponto de partida para as incursões e de outros filósofos. Em Princípios, e nas Cartas ao Pe. Mesland, Descartes definiu o livre-arbítrio como o poder do homem de recusar a Verdade e o bem até mesmo na presença da evidência que se manifesta.

Propôs o filósofo que a Verdade provinha em tal magnitude de Deus (Força Criadora) que somente na ignorância fazia o homem a escolha pelo lado do mal.

Assim temos na sua Quarta meditação:

...Pois, para que eu seja livre, não é necessário que eu seja indiferente na escolha de um ou outro dos dois contrários; mas, antes, quanto mais eu tender para um, seja porque eu conheça evidentemente que o bem e o verdadeiro aí se encontram, seja porque Deus disponha assim o interior do meu pensamento, tanto mais livremente o escolherei e o abraçarei. É certo que a graça divina e o conhecimento natural, bem longe de diminuírem minha vontade, antes a aumentam e a fortalecem. De modo que essa indiferença que sinto, quando não sou de maneira alguma impelido mais para um lado do que para outro pelo peso de alguma razão, é o mais baixo grau de liberdade, e faz antes parecer uma carência de conhecimento do que uma perfeição na vontade; pois, se eu sempre conhecesse claramente o que é verdadeiro e o que é bom, nunca teria dificuldade em deliberar qual juízo e qual escolha deveria fazer; e, assim, eu seria inteiramente livre, sem nunca ser indiferente.

Reconhece Descartes em poucas palavras o efeito da intuição superior e a fragilidade da liberdade quando esta não está firmemente voltada para o bem.

Assevera o Racionalismo Cristão sobre o mau uso do livre-arbítrio:

O maior prejuízo, porém, que o espírito pode causar a si mesmo, no interesse da sua evolução, é o de praticar o mal consciente, intencional e perseverante (...)

Consciência e vontade entram em cena para dar uma dimensão maior ao exercício do livre-arbítrio. Para o espírito encarnado ou àquele estagiado no astral inferior, existe uma gradação dos efeitos da escolha, consoante o seu grau de consciência na prática do mal ou do bem.

Deixa de ser o livre-arbítrio, nesta concepção ampliada do Racionalismo Cristão, unicamente faculdade de escolha entre Bem e Mal ou melhor entre Evolução e Estagnação, para tornar-se o timão do espírito na sua jornada evolutiva. (O espírito pode estagnar em sua evolução, porém não retrocede nos degraus alcançados.)

É então o livre-arbítrio + a consciência o binômio responsável pela ascensão do espírito na sua jornada.

O homem é capaz de raciocínio e avaliação consciente das suas escolhas e somente ao ingressar em profundidade nesta consciência é que pode fazer bom uso da faculdade arbitral.

quem conhece o outro é sábio
quem conhece a si mesmo é iluminado

(Escritos do curso e sua virtude - Tao te ching - Lao Tsé)

O filósofo Harry G. Frankfurt faz distinção entre desejos instintivos ou da vontade ordinária e desejos racionalizados ou podemos dizer conscientes. Colhemos do trabalho da filósofa Maria Clara Dias as seguintes interpretações e citações da obra de Frankfurt:

Falamos de um desejo de primeiro nível, quando alguém busca realizar aquilo que quer, e de um desejo de segundo nível, quando quer ou não possuir um determinado desejo. Alguém possui desejos de segundo nível quando gostaria de ter determinados desejos ou quando gostaria que determinados desejos fossem a sua vontade.

Graças à faculdade da razão, uma pessoa é capaz de alcançar uma consciência crítica de seus desejos e constituir volições de segundo nível. Nesse sentido, a própria estrutura da vontade limita a aplicação do conceito de pessoa ao âmbito dos seres racionais e, dentre estes, aos seres capazes de fazer de seu próprio desejo objeto de reflexão. Apenas porque uma pessoa possui volições de segundo nível é capaz de desfrutar de uma vontade livre.

Uma pessoa usufrui de uma vontade livre quando seus desejos e suas volições de segundo nível estão em concordância. Quando esta concordância não acontece, ou quando o indivíduo tem consciência de que ela seja um mero fruto do acaso, ele vivencia sua incapacidade de desfrutar de uma vontade livre. É assim que um indivíduo, que vive na dependência da satisfação de seus desejos de primeiro nível, tem consciência de sua própria carência de liberdade.

Em outras palavras, o indivíduo tomado pelos seus instintos e tendências negativas atávicas não tem o grau de consciência racional necessário para tomar posse da faculdade do livre-arbítrio na sua plenitude. Nestes casos é quase sempre pelo sofrimento que desperta para a necessidade de reforma interior.

Evoluindo na sucessão de encarnações e já tendo atingido um grau superior, o indivíduo de hábitos mais educados e voltados para sua evolução, busca, respeitando a sua programação encarnatória, consolidar esta concordância entre desejo e vontade para que possa ser realmente livre. Quando bem sucedida a sua empreitada, vai-se assenhoreando da faculdade arbitral e, encarnação após encarnação, volição e desejos assumem tal grau de concordância que as experiências do mundo Terra não mais constituem desafio e somente resta o sofrimento pela materialidade reinante, estando, deste ponto em diante, o espírito livre do ciclo encarnatório.

Para programar a evolução da consciência enquanto encarnados devemos, então, reconhecer as tendências atávicas e o modo de condicionamento da faculdade arbitral para melhor avaliar em que momento estamos realmente nos conduzindo pelo livre-arbítrio ou sofremos a inevitável influência do meio e dos pensamentos negativos de que está impregnada a atmosfera. Sem esta consciência, utilizamos somente parcialmente o livre-arbítrio e os resultados são o retardo da evolução e a repetição de erros seculares.

Estudando os enunciados de Pavlov, propusemos analogias para ampliar o entendimento do comportamento atávico, ao estudarmos Thorndike, Whatson e Skinner, bem como o fizemos com Eric Berne (vide palestra "Programando a Evolução"), estaremos avançando no entendimento das influências do comportamento e suas relações sociais e psíquicas para o domínio da faculdade do livre-arbítrio.

Edward Lee Thordike desenvolveu estudos com animais e estabeleceu a lei dos efeitos e descreveu implicações para a pedagogia e antropologia:

Podemos em analogia espiritualista compreender que o desejo nascido de tendências materiais, seja de natureza atávica ou pelo mau uso do livre-arbítrio, se consolida pelas sensações prazerosas enraizadas na matéria, nublando a razão.

Assim, viciados nas sensações momentâneas de prazer material, sejam estes colhidos dos pensamentos viciosos, da sensualidade, das emoções descontroladas, dos princípios químicos embriagantes e das efluviações dos espíritos inferiores, mantém-se a criatura aprisionada com a mente embrutecida e incapaz de racionalmente reconhecer o bem. Permanece assim longe de se assenhorear da faculdade do livre-arbítrio.

Quem vence o outro tem força
Quem vence a si é forte

(Escritos do curso e sua virtude - Tao te ching – Lao-tsé)

O indivíduo assim obliterado não está na verdade de posse da faculdade arbitral, pois esta reside na razão.

Como vislumbrou Descartes, o arbítrio é libertador se voltado para o bem (evolução), porquanto este dá condições ao espírito de ampliar a sua consciência, alçar vôos cada vez mais amplos rumo à perfeição.

Ao espírito encarnado ainda vacilante, as punições que lhes são reservadas pela sociedade não o corrigem porquanto, na sua mente inconsciente, o seu desejo de liberdade para fazer o que lhe apraz é inalienável e suplanta os conceitos de bem e mal preconizados como elementos de escolha do livre-arbítrio. Para os viciados no erro e intencionalmente voltados a este, livre-arbítrio significa agir conforme lhes impinge intimamente os instintos, as tendências e intuições negativas. Assim, grande parte da humanidade caminha vacilante entre o erro e o acerto, sem consolidar o domínio da faculdade do livre-arbítrio.

A pessoa superior escutando o curso
pratica-o zelosamente
A pessoa mediana escutando o curso
ora insiste
, ora desiste
A pessoa inferior escutando o curso
ri estrepitosamente
Não risse não seria o curso

(Escritos do curso e sua virtude - Tao te ching – Lao-tsé)

Não sendo o aspecto punitivo a mola propulsora do aprendizado, qual seria a força capaz de reorganizar o pensamento e facilitar ao indivíduo desejoso de progresso na esfera do autodomínio?

Skinner avançou um pouco mais e identificou modos de modelar o comportamento através do que denominou reforço positivo e negativo. Segundo ele, o comportamento pode ser modelado através de reforços positivos e negativos, o que implica também numa relação causal entre reforço (causa) e comportamento (efeito); o programa experimental de Skinner é o da utilização sistemática de um reforço, privando ou não o sujeito do mesmo conforme um comportamento pretendido seja manifesto; a eficácia do reforço depende da proximidade temporal e espacial em relação ao comportamento que se pretende modelar, sem este cuidado poderia se confundir com outro comportamento sobre o qual não se pretendia atuar; um reforço positivo fortalece a probabilidade do comportamento pretendido que segue. O seu registro é a presença (positividade) de uma recompensa; um reforço negativo enfraquece um determinado comportamento em proveito de outro que faça cessar o desprazer com uma situação. Portanto, o seu registro é a ausência (retirada) de um estímulo que cause desprazer após a resposta pretendida; ambos, entretanto, incidem após a emergência de um comportamento pretendido pelo experimentador.

Antes de propormos novas analogias espiritualistas, para um melhor entendimento dos usos e abusos das descobertas de Skinner na atualidade, vamos explorar as diferenças entre punição e reforço negativo e mais, entre recompensa e reforço positivo.

A sociedade repete nos seus organismos legais e na pedagogia do lar e escolar o desgastado e ineficaz recurso da punição, enquanto a política, a propaganda e as instituições religiosas, dentre outros, dominam as massas com a coerção psíquica das técnicas de reforço positivo e negativo enunciadas por Skinner. Mau uso das suas descobertas que não lhe desmerecem a genialidade, porquanto todo o conhecimento colhido pelo homem em entendimento da sua natureza pode ser aplicado para o bem ou para o mal.

A punição não se sobrepõe ao prazer material despertado pelas emoções, pois – cessados os seus efeitos – é esquecida por ser inibidora e constrangedora, enquanto as emoções advindas da satisfação dos desejos são excitantes e esfuziantes.

Quanto maior o sofrimento moral da criatura e as privações materiais, maior o anseio por felicidade e abastança. As religiões oferecem fórmulas para que se obtenha, de forma menos dolorosa, o equilíbrio entre a vontade e desejos e, enquanto alguns se prendem aos discursos da beatitude, outros se deixam embriagar pelas promessas de prosperidade material como recompensa pela aproximação e fidelidade aos princípios religiosos e seus proclamadores.

Assim, as práticas religiosas, promovendo a substituição dos obsessores e substituindo as sensações de desassossego e abandono pela assistência astral dos organizadores astrais destas religiões, muitas vezes mais danosos do que os seus obsessores anteriores, exercem a técnica do reforço negativo. Esta consiste em retirar o estímulo negativo ou reduzi-lo, tão logo a pessoa assuma o comportamento pretendido. Desta forma, fica reforçado o comportamento pelo chamado reforço negativo.

Sendo o objetivo a afiliação e submissão da criatura, tão logo afinada a sua vibração espiritual com as efluviações emanadas dos mentores astrais e encarnados da prática religiosa, este estará concretizado. Daí por diante este membro da facção religiosa torna-se mais um defensor ferrenho da sua agremiação.

Dissidências são tratadas com o abandono das criaturas aos seus inimigos astrais ou entidades afins, instruídas para avassalar o desertor. Se este volta, serve de exemplo para maior submissão dos demais. Se adoece ou sofre perdas materiais, sucumbindo ao desarranjo da faculdade racional e prejuízo ao seu perispírito causado pela má assistência, tem estes efeitos apontados como resultado da sua insubmissão.

As religiões, na sua promessa de eliminar a aparente incapacidade humana de orientar a vontade em equilíbrio com os desejos, na verdade resultante das intuições inferiores que recebem, atingiram na sua associação com recursos da manipulação do comportamento, usuais na propaganda comercial, um poder de coerção da mente outrora aplicado sem conhecimento científico.

O condicionamento operante refere-se aos estímulos que seguem a resposta, isto é, posterior a ela, ao contrário do condicionamento respondente (proposição de Watson) em que o estímulo antecede a resposta. Com a combinação destas técnicas tem-se como resultado o maior sucesso nas investidas de controle do comportamento das criaturas.

Quando as criaturas cedem às promessas de dia melhores, sem maior esforço, o fazem por ambicionar a felicidade. Quanto mais se convencem do poder de que foram ungidas por tais práticas, mais confiantes no acerto das suas ações e modo de pensar e desta forma mais concentradas e bem-sucedidas materialmente, porém, ao adormecerem o raciocínio e cederem o seu livre-arbítrio a outrem, estacionam o seu desenvolvimento espiritual.

A propaganda em geral promete sensações de prazer associada à imagem de prosperidade e é desta mesma forma, utilizando as técnicas de reforço positivo, com imagens e depoimentos favoráveis, que as religiões modernas, em rápido crescimento, promovem a programação das mentes das criaturas para que cedam os seus recursos advindos do trabalho e fortaleçam estas agremiações e seus organizadores.

Nossa proposição em analogia espiritualista:

Estas substituições precisam tornar-se conscientes e para tal as técnicas de visualização positiva e ancoragem, empregadas na neurolingüística, são aliados importantes e de fácil aprendizado.

O Racionalismo Cristão é doutrina que, esclarecendo ser o livre-arbítrio a faculdade que, aliada ao raciocínio e a vontade dirigidos para o bem, promove a evolução do espírito, assume posição destacada no plano de evolução da humanidade.

Não promete felicidade e tampouco riquezas materiais, porque foi implantada no planeta Terra para libertar as criaturas pela educação do uso das suas faculdades superiores. Estas faculdades, quando desenvolvidas e conscientemente aplicadas, garantem à criatura a capacidade de modificar a sua vida a qualquer tempo, programando de forma consciente o seu Condicionamento evolutivo.

Bibliografia consultada e/ou mencionada no texto

"O livre-Arbítrio". In: Racionalismo Cristão. 24 ed. Rio de Janeiro: Centro Redentor, 1965.

Descartes, René. Meditações Metafísicas . 1 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

Frankfurt, H. Freedom of the Will and the Concept of a Person . The Journal of Philosophy 68 (1971).

Skinner, B. F. Sobre o Behaviorismo 5 ed. São Paulo: Cultrix, 1995.

Lao-tsé . Escritos do curso e sua virtude - Tao te ching 1ed. digital – Mandruvá; http://www.hottopos.com/livros/escritos.htm

Julio César do Nascimento, Monte Alto - SP, março de 2004

 

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