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Mãe admirável

Maria Cottas

Numa pitoresca aldeia de Portugal vivia um modesto casal, lutando com dificuldades para manter os filhos e trazê-los fartos e limpos. Todas as manhãs, via-se passar um garoto forte e corado, todo circunspeto, muito asseadinho, com os livros e a lousa debaixo do braço, a caminho da única escola da aldeia, bem desprovida de meios de instrução. Na escola havia quem apreciasse a pontualidade do rapazito e como lá aparecia sempre limpo bem disposto. Seu pai, modesto guarda da aldeia, era estimadíssimo pelos conterrâneos, por sua maneira correta de proceder e espírito de solidariedade que sempre demonstrava aos que dele precisavam nas horas críticas da vida.
Sua mãe, alta, de porte distinto, sempre ocupada com seus afazeres e com os filhinhos, poucas vezes se via a conversar com os vizinhos e as comadres, como era comum nas aldeias naquele tempo. Numa bela manhã, bem cedinho, viu-se passar o menino Antonio acompanhado de sua boa e dedicada mãe, a caminho da cidade de Boticas, onde devia ele prestar exames.
Alguns quilômetros teriam de andar aquelas criaturas até chegarem ao seu destino, pois os meios de comunicação nas aldeias portuguesas eram então deficientíssimos e o único cavalo de que podiam lançar mão já tinha sido maldosamente alugado por outro rapaz, filho de um lavrador rico e que freqüentava a mesma escola que Antonio.
Cansada da longa caminhada, voltou a senhora Maria descalça, com os pés sangrando, mas radiante de alegria por ter conseguido levar o filhinho a exame, o que era toda a sua aspiração. Bendito zelo! Bendito amor!
Que exemplo de amor materno dava, lá no fundo de uma aldeia, aquela mulher sem instrução, mas inteligente e forte, que não trepidou em, de pés no chão, castigar-se a si própria, na ânsia de prodigalizar instrução ao filho querido. Essa modesta criatura honra a terra que lhe serviu de berço.
Da obscura trincheira onde trabalhava, combatendo as necessidade da vida, ela, mãe dedicada e carinhosa, elevou o filho, procurando dar-lhe uma instrução que ela própria não teve, mas da qual sentia necessidade, para torná-lo um homem valoroso, útil à coletividade ou a estas terras do Brasil, para onde veio mais tarde, deixando essa mãe abnegada e extremosa banhada em lágrimas.
Foi uma mulher varonil! Desejaria apontá-la a inúmeras mães que, tantas vezes com mais recursos, descuram da educação e instrução de seus filhos, que crescem na perniciosa escola das ruas, entregues às devassidões e aos vícios.
Desejaria que a vissem esbelta, sem orgulho nem inveja do filho do lavrador rico, modesta e grandiosa no cumprimento do seu árduo dever de mãe!
Não teve a felicidade de tornar a ver o filho, que se fez homem aqui no nosso Brasil, onde se tornou tão brasileiro como os aqui nascidos, mas terá, sem dúvida alguma, orgulho de, espiritualmente, vê-lo tão reto, tão justiceiro e honesto como o idealizava.
Morreu beijando o retrato do filho querido, e ele nela pensa sempre narrando às suas filhas esse episódio de sua infância pobre, que jamais esquecerá.

(Do livro Contos morais)


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