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Francisco Gomes de Abreu, memórias de um amigo

Henrique Carlos Sequeira

Luís de Camões – um dos espíritos do Astral Superior que exerceram ação fluídica sobre Luiz de Mattos, fundador do Racionalismo Cristão, auxiliando-se na fase inicial da implantação dos princípios doutrinários (A Vida Fora da Matéria) – cantou em Os Lusíadas aqueles que, por obras valorosas, se vão da lei da Morte libertando (1,2) e, também, outros em quem poder não teve a morte (1,14). Cantou, ainda, aqueles que, no fim da idade, têm lugar no templo da Suprema Eternidade (1,17).
Esta a síntese, aqui destacada, do período mais universal e universalista de uma pequena nação – Portugal – construído, na nossa perspectiva, com grande preponderância da figura ilustre de D. João II. Agregou, incitou e, essencialmente, exaltou, com clarividência, a vontade valorosamente organizada de um povo, suporte dos grandes feitos humanos.
Assim se abriram "novos mundos ao mundo" que abrangeram as Terras de Santa Cruz (Brasil), onde rompeu a aurora do Racionalismo Cristão, outro, diverso e mais valoroso, "mundo" dado ao mundo, "que a tanto o engenho humano não se estende" (X 80).
Aqui se encontra a razão última da possibilidade da nossa vivência com Francisco Gomes de Abreu, o homem forte que fez forte a fraca gente e alto ergueu a forte gente, no contato com ele havido.
Francisco Gomes de Abreu isentou-se, por mérito próprio, de qualquer adjetivação humana. Dominou o "Adamastor'' – o astral inferior (na expressão dele, o inimigo público número um) – na sua trajetória espiritualista, erguendo-se na rota evolutiva que traçou, muito além daquele obscuro e monstruoso gigante, tornejando o "Tormentório" (V 50) – Cabo das Tormentas, que transformou, através da Luz, no Cabo da Boa Esperança para todos – e muitos foram – que com ele conviveram.
Francisco Gomes de Abreu foi o fundador da Filial Lisboa do Racionalismo Cristão e o timoneiro lúcido que, para nós, ali construiu um período inolvidável, de 15 anos, de intensa e vigorosa atividade espiritualista, espiritualizadora e de intelectualidade. É hoje, em plano astral, presidente astral da Filial Aveiro do Racionalismo Cristão.
Homem de ação e de iniciativa fecundas, nunca se deixou balizar por entraves burocrático-administrativos. Sempre se agigantou na espiritualidade e intelectualidade, utilizando a burocracia como insignificante meio, mas indispensável apoio da vida material a que uma organização não deve furtar-se.
Profundamente discreto e leal, mobilizava e incentivava vontades, tornado-se, sempre, aparentemente dispensável para o êxito das múltiplas tarefas em que muitos se envolviam com naturalidade e empenhadamente. Do seu cultivo inato do Amor pela Doutrina nascia o zelo espiritualista de todos.
Francisco Gomes de Abreu era a Dignidade. Ninguém afastou, muitos recuperou. Foi o impulsionador sem exibicionismo nem astúcia. Não havia nele, portanto, espaço para a aparência ou esconderijo para fragilidades de comportamento ou de caráter. Tinha consigo a vivência com que Maria de Oliveira o distinguiu.
Francisco Gomes de Abreu deu-se totalmente à Doutrina, na Filial de Lisboa. Estava sempre presente (sem de chamamento necessitar) junto de quem sofria ou de amparo espiritual carecesse. Abria e rasgava em cada um, por exemplo, a convicção pela beleza do Bem, quer no convívio direto com ele, quer nas suas doutrinações nas sessões públicas ou particulares. Na sessão do segundo sábado de cada mês era estimulante, excepcional.
As sessões de esclarecimento constituíam cenários vivos de espiritualidade diretamente atuante sobre todos – obsedados, principalmente – quantos o assediavam e o procuravam fraternalmente, desesperados.
Ele era um verdadeiro líder da espiritualidade e intelectualidade. Erguia-se permanentemente como tal, porque constantemente se queria apagar perante as já referidas múltiplas equipes de trabalho, cujo funcionamento alimentava. Tudo era feito com espontaneidade, alegria e felicidade, sentidas no amor ao semelhante, companheiros ou não. A filosofia dominante era darmo-nos todos a todos, com ele sempre à frente, no exemplo.
Francisco Gomes de Abreu não era certamente perfeito. Era, certamente, sim, um Homem, irresistível pelo fulgor da sua espiritualidade e intelectualidade ativas, permanentemente acesas e iluminantes.
O convívio, sempre agradável, com Francisco Gomes de Abreu era reconfortante, também, nas muitas excursões, passeios e viagens de estudo organizados para convívio e elucidação entre companheiros de Lisboa e com companheiros das outras Casas Racionalistas Cristãs, em Portugal, designadamente quando das comemorações dos respectivos aniversários da fundação. Sentíamos, na oportunidade, mais abertamente, o sentido de humor e a sua valência cultural e a sua finura de caráter.
Os textos escritos das intervenções então por ele produzidas e as suas doutrinações orais gravadas na Filial de Lisboa e as cartas por ele redigidas constituem, para nós, patrimônio espiritual do Racionalismo Cristão. Muitas pessoas procuravam manter com ele convivência no interior dos respectivos lares, tendo a muitos servido de âncora de consistência.
Dos concertos musicais – tantos foram – que, com Maria Madalena, a minha companheira na vida, juntos ouvimos, aos sábados, ao meio-dia, só permanece em nós a continuada harmonia das sinfonias espirituais por ele compostas.
Esses diálogos semanais, aos sábados, à tarde, conduziam, posteriormente, a profundas reflexões espiritualistas de cada um perante si próprio, alicerçadas no vasto leque de opiniões disponibilizadas. Quantas vezes terminavam ou prolongavam-se no lanche sem programa, que se lhes seguia.
Dos passeios à beira-mar, pela dimensão de espiritualidade e intelectualidade dele recebidas, quando, excepcionalmente, conseguíamos – Maria Madalena e eu – trazê-lo fisicamente da Filial de Lisboa (o porto de abrigo franco e continuamente aberto à navegação que cruzava o alto mar da vida, construído sob sua orientação) até ao Algarve (Sul de Portugal), ficou-nos a brisa do amor e as ondas da saudade.
No jornal A Razão (maio de 1984), assinalamos a passagem do aniversário de Francisco Gomes de Abreu, com o artigo intitulado 70 anos de vida física. Perfil de um homem. Hoje, passados 20 anos, testemunhamos ao homem com quem, naturalmente, comemoraríamos 90 anos de vida física, o esforço que permanentemente fazemos para merecermos o seu convívio e o seu exemplo.
Com a sua esposa – senhora Dona Maria Clementina – Maria Madalena e eu mitigamos momentos da saudade da vida preenchida com Francisco Gomes de Abreu.
Que nossa pena escrito tenha os pensamentos que a ele se elevam, como memória do sono de Francisco Gomes de Abreu, por onde seguiu para o "templo da suprema Eternidade", onde, após quase dez anos de acordada e viva partida, deixamos o abraço de quem procura dar merecimento à sua amizade.

(O autor é freqüentador da Filial Lisboa.)


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