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Favoritismo prejudicial

Maria Cottas

Uma das falhas mais comuns - e, por que não dizê-lo, bem grave - na criação dos filhos é o favoritismo por um deles demonstrado pelos pais - ou porque é mais inteligente e esperto, ou porque é enfermo - em prejuízo dos demais irmãos.
Não há dúvida de que requer cuidados e atenções especiais um filho doente, mas, por isso mesmo, não se deve descurar de sua formação moral e educação, ministrando-a com brandura e não satisfazendo todas as suas vontades, às vezes, até em prejuízo de sua própria saúde, concorrendo para que adquira o complexo de eterno enfermo.
Crianças que só recebem carícias e têm suas vontadinhas sempre satisfeitas gozam de vantagens e privilégios em detrimento de outras, que são, enfim, mimadas em excesso pelos pais, tornando-se presunçosas e antipáticas, transformando-se em pequenos déspotas nos lares.
Estou daqui a ver pais que, ao lerem estas linhas, asseverarão que amam igualmente a todos os filhos, aos quais dispensam idêntico tratamento e afeição.
E assim deveria ser.
Mas a verdade é que sabemos de filhos que, alvos de carinhos e atenções em demasia, mais tarde, além de não serem reconhecidos aos pais, ainda lhes causam desilusões e desgostos devido às falhas de educação.
Se considerarmos a imperfeição humana, chegaremos à conclusão de que a parcialidade e o favoritismo dispensados a determinado filho causar-lhe-ão complexos e prejuízos morais, atraindo ainda inimizades e desinteligências, no lar e fora dele, que muito o prejudicarão.
Não é menos prejudicial o hábito de certas mães ressaltarem a graça, a formosura ou o talento de seus filhos em suas próprias presenças, mostrando-se, em termos elogiosos, orgulhosos deles.
Não serão esses os filhos capazes de se sacrificarem, quando adultos, pelos pais, provando seu amor filial, numa preocupação de vê-los felizes e evitar-lhes desgostos e trabalhos.
Ao contrário, tornam-se egoístas e pretensiosos, que só pensam na satisfação de seus gozos e caprichos, fechando os olhos às necessidades da família, pois tudo quanto venham a possuir, produto do trabalho e esforço dos pais, é pouco para a satisfação de suas vaidades e luxos.
A verdade, porém, é que a tal ponto chega, às vezes, o favoritismo de pais insensatos por um determinado filho que perdem a noção de justiça e dos prejuízos morais que lhe estão acarretando. Mas aqueles que assim procedem tentam justificar-se perante eles próprios, argumentando que os prejudicados por esse favoritismo nem se apercebem do trato diferente que recebem. Equivocam-se, pois não há olhar mais penetrante que o de uma criança, nem perspicácia mais aguda para perceber tal injustiça. As crianças sabem interpretar as mais sutis inflexões da voz materna ou paterna e percebem quando elas vibram de ternura ou de censura.
E ninguém mais do que uma criança pode sentir a injustiça e magoar-se com ela. Desde cedo, o menino que nasceu com espírito forte e boa índole aceita, resignado, a idéia de seus pais não lhe quererem como aos outros irmãos, mas esse reconhecimento amargará a sua infância e lhe deixará uma recordação penosa para toda a vida. Tratando-se de um espírito sensível, as conseqüências são danosas. Mãe de quatro filhas, como me sentiria entristecida se me acusassem de querer mais a uma filha do que a outra, quando reconheço ser prejudicial o favoritismo dos pais por um filho.

Do livro Páginas soltas


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