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A mulher do século XVIII

Maria Cottas

A mãe que aconchega ao seio o filho, fazendo de um pequenino ser um homem, a mulher trabalhadeira e inteligente, que faz do trabalho um lenitivo e dá à vida o conforto e a paz, hão de ser os símbolos imperecíveis da civilização que já se esboça neste século de audácias, conquistas e descobertas mecânicas sensacionais.
O século XIX foi um século de desequilíbrio. Foi o século de Napoleão, de Chateaubriand, de Leão XIII, de Rothschild, de Bismarck e de Lamartine. Todas as aberrações e todas as virtudes tiveram lugar nesse século.
Sendo sempre na família e, por isso, na situação da mulher que se deve ir procurar o estado físico e moral dos povos, porque é da família que se evola a alma vigorosa que engrandece as sociedades, diremos o que foi a sociedade no século XVIII.
Se as sociedades humanas têm caído por depressões morais, é porque nelas a mulher nunca teve o seu merecido lugar de ação.
No século XVIII, a situação da mulher francesa é análoga à de todos os outros povos cultos. Nesse século, a mulher do povo em França, como dizem os Goncourt, era um ser que não era mulher senão pelo sexo. Forte, viril, resistente ao trabalho, o ódio e a revolta imperavam no espírito da mulher do povo. Ela podia, então, ascender ao alto mundanismo pela devassidão. Tinha as maneiras das cortesãs, destacando-se pelos seus encantos e as suas graças. Foi do baixo povo que saíram rainhas de beleza, atrizes e cortesãs famosas.
Passada a mocidade, a mulher francesa do século XVIII fazia-se filósofa e substituía as graças pelas seduções do espírito. Os seus salões abriam-se aos filósofos, aos escritores e aos críticos. Era ali que se faziam as reputações, preparavam-se as eleições acadêmicas, urdiam-se as intrigas da corte e distribuíam-se benefícios, empregos e títulos. Esse século foi dirigido pela mulher. Sob a influência de Rousseau, a mulher francesa se entregou, por algum tempo, ao amor maternal e à família. Imperava nessa época, porém, uma forte corrente fictícia, porque a mulher de então era incapaz de amar, por ser fútil, indiferente e dissipadora.
A educação da aristocracia no século XVIII foi detestável. A mulher não tinha infância; a sua primeira educação consistia em fazer da criança uma pequena grande dama, maneirosa e de graças artificiais. Antes de saber ler, à pequenina nobre ensinava-se fazer reverências. Quando a mandavam às Tulherias, recomendavam-se que não saltasse, que não corresse, que mantivesse um ar de grande senhora.
Se ia a um baile infantil, punhamlhe cabeleira postiça com grinalda de flores, e proibiam-lhe que se despenteasse. Muito cedo ia para o convento, onde lhe era dada uma educação meio mundana, meio ascética, uma educação que ia desde o catecismo à lição de reverências. Nos conventos amontoavam-se esposas divorciadas, amantes de príncipes, viúvas mais ou menos inconsoláveis e toda essa população dava ao convento um ar hipócrita e mundano, tão deletério para as jovens educandas. Nos claustros repercutiam os ecos mundanos de Versalhes e de Paris!...
Nesse século a mulher não tinha mãe, como não tinha infância. Via o filho ao nascer e no dia em que voltava da casa da ama; durante os poucos anos que sua filhinha passava em casa, ficava sob os cuidados da mestra, num andar, à parte, donde descia para ver a mãe e com ela passar apenas cinco minutos. No convento poucas vezes era vista pela mãe; via-a no parloir, em um passeio ao boulevard, ou então quando lhe vinha anunciar, que lhe tinha destinado um marido e que era preciso começar o enxoval.
Era assim educada a mulher do século XVIII!...

Do livro Folhas esparsas


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