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Limitação ao crescimento

Julio César do Nascimento 

Observa-se, na sociedade contemporânea, um distanciamento cada vez maior entre as oportunidades de bem estar de uns poucos em detrimento da maioria. Fosse este estado de coisas função de fato observável dentro do horizonte histórico e materialista conhecido, mais fácil seria a compreensão das razões e ações que modificassem em definitivo as causas. Porém não é tão simples. A iniciativa de proteção e de amparo que os governos e parte da sociedade aplicam, salvo raras exceções, tem produzido desequilíbrios sociais de maiores ou menores proporções, consoante a intensidade da intervenção. Tal qual os sistemas ecológicos quando submetidos às agressões pela tentativa de redirecionamento de um ambiente ou membro do intrincado conjunto de seres que nele convivem.

Assim, o desenvolvimento humano vem carecendo de um entendimento do que poderíamos chamar de ecologia social, para fazer uma analogia dentro do quadro de referência da maioria, ou melhor, espiritualista e humanístico, embora do entendimento de um número menor de seres. Esta forma de ver a sociedade e seus componentes implica numa visão do todo, onde cada uma das partes é reconhecida como significante e determinante do equilíbrio e desenvolvimento das demais. Também significa que a visão materialista é reducionista e limitada, para abranger a compreensão desta interdependência. Como poderia um ser humano a partir desta visão limitada, reconhecer a importância do desenvolvimento de um outro, que não vive no seu país, que não pertence à sua classe social e que não participa do seu mundo globalizado de trocas ou de produção? Enfim como atribuir valor a um outro ser não relacionado ao seu grupo de convivência ou de necessidades?

Peter Senge no seu livro A quinta disciplina apresenta um modelo de comportamento de sistemas em que a limitação ao crescimento é o resultado da aceleração do crescimento de uma das partes em detrimento das outras. Nesta visão do autor, o próprio sistema desenvolve o que ele denominou de função de balanceamento, que se encarrega de frear o desenvolvimento do todo, obrigando o sistema a encontrar um novo equilíbrio para somente então retomar o crescimento. Vivemos na atualidade um momento de balanceamento, onde, por um lado o desenvolvimento material é enorme e por ele todos anseiam, e por outro, o desenvolvimento espiritual é negligenciado e a vida desvalorizada, resultando em agravamento dos desequilíbrios sociais e na limitação ao crescimento e bem estar, mesmo daqueles que atingiram um grau de desenvolvimento material considerável. Muitos dos que se encontram no ápice do sistema buscam, desesperadamente novas formas de ampliar o seu horizonte de benefícios e bem-estar e por outro lado encontram barreiras cada vez maiores, pois o sistema é baseado na ampliação do consumo de bens materiais. Porém, não têm os excluídos como e nem porque participar desse consumo. Esta limitação de "mercado", obriga a preços e impostos cada vez maiores e a uma corrida sem limites para que os que atingiram o nível de consumo possam manter-se nele. Atingido o limite de ganhos com a produção real de bens, existe a "bolsa de futuros", a propiciar as apostas sobre o que será de maior valia no futuro. Apostas sobre um valor que não está lastreado no trabalho e que, portanto, não pode trazer real benefício àqueles envolvidos na produção do bem.

Quando o sistema voltado à produção de bens tangíveis atingiu um nível muito superior à capacidade de consumo dos habitantes capazes de consumi-los, surge um novo boom de produção para atender a um grupo ainda mais seleto, agora sobre os intangíveis, as empresas ".com", e as apostas nas bolsas ganham novo produto: a troca de informações através do ciberespaço.

Neste quadro, é cada vez maior o número dos que despertam para a visão humanística.

A princípio, insatisfeitos com todos os benefícios obtidos e na busca de algo que traga a felicidade, tornam-se atuantes nas iniciativas de cunho social e neste caminho descobrem o real interesse pelo coletivo onde fica evidente que não será de valia a satisfação de uns poucos sem que seja possível à maioria, a garantia de condições mínimas de saúde, moradia e trabalho.

Nos mesmos centros de consumo e abastança, se levantam vozes tanto dentre os excluídos quanto dentre aqueles que se destacam no atual sistema, clamando pela visão que pode garantir talvez pela primeira vez na história conhecida do homem uma civilização merecedora deste nome. Já é, então, bem-vinda a visão crítica dos jovens que se voltam ao trabalho voluntário e questionam o exagero da valorização do ter em detrimento do ser, é também compreensível o desenvolvimento das diversas seitas e religiões que abrigam as pessoas do julgamento da sua consciência.

A visão racionalista e espiritualista há de se impor pela inexorável evolução dos seres, embora através de enormes sofrimentos para todos os que se mantiverem fiéis ao atual modo equivocado de entender o que se apresenta como a nossa melhor oportunidade de crescimento dos últimos séculos.

Julio César do Nascimento 
julho de 2001

 

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